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quarta-feira, 2 de outubro de 2013

Menino argentino de 6 anos é reconhecido como transexual

Atualizado: 26/09/2013 22:16 | Por Agência Brasil, Agência Brasil


Monica Yanakiew

Correspondente da Agência Brasil/EBC

Buenos Aires - A presidenta Cristina Kirchner aceitou hoje (26) o pedido de uma mãe para mudar o nome na carteira de identidade de menino argentino de 6 anos, que desde os 2 se considera menina e alterar oficialmente de gênero e nome. Antes de recorrer à presidenta, os pais da criança já haviam feito o pedido para alterar o documento da criança, mas ele foi rejeitado três vezes pelo Registro de Pessoas da província de Buenos Aires. Um dos argumentos é que era preciso esperar a puberdade para tomar uma decisão.

A mãe, Gabriela, não desistiu e escreveu uma carta para a presidenta Cristina Kirchner e outra ao governador de Buenos Aires, Daniel Scioli. Hoje (26), a pedido do governo, o caso foi revisto e o pedido aceito. De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República do Brasil, o transexual é aquele que 'tem uma identidade de gênero diferente do designado no nascimento, tendo o desejo de viver e ser aceito como sendo do sexo oposto'.

Segundo o presidente da Comunidade Homossexual da Argentina (CHA), Cesar Ciugliutti 'é o primeiro caso no mundo em que foi possível modificar o gênero de uma pessoa tão jovem em um documento sem recorrer à Justiça'. Gabriela usou a Lei de Identidade de Gênero para embasar o caso do filho.

Aprovada em maio de 2012, a legislação permite a travestis e transexuais mudarem seus nomes nos documentos sem recorrer à Justiça. Pelas estimativas da Federação Argentina de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (FALGBT), a lei deve beneficiar 60 mil pessoas. 'Esta foi a primeira vez que um Estado dá um documento novo a uma pessoa tão jovem, sem a intervenção de um juiz', disse a psicóloga Valeria Pavan em entrevista à Agência Brasil. Pavan é psicóloga da família há dois anos.

'Conheci Lulu quando ela tinha 4 anos', disse Pavan. 'Na época chamava-se Manoel e era um menino triste. Chorava muito, se escondia debaixo da cama, vestia uma camiseta da mãe, que nele parecia um vestido e colocava um pano na cabeça para fingir que tinha cabelos longos. Desde os 2 anos ele soube que queria ser menina', explicou.
Tanto Lulu, quando Manuel são nomes fictícios, que a família usou para divulgar o caso na imprensa e, ao mesmo tempo, proteger a privacidade da criança. O primeiro que percebeu que Manuel era diferente dos outros meninos foi seu irmão gêmeo. 'Ele dizia à mãe que Manuel era uma menina, que só queria brincar de boneca, sem saber que estava dizendo uma verdade', disse Pavan.

Segundo a psicóloga, as pessoas definem sua identidade cedo na vida. 'Ouvi muitas histórias de vida, de adultos e adolescentes, que tem lembranças de como se sentiam mal, na própria pele, desde os 3 ou 4 anos', disse Pavan. 'A novidade, neste caso, é que os pais deram ouvidos à criança. Na maioria das vezes, não dão'.
Antes de recorrer a Pavan, a família tentou outros psicólogos, que recomendavam terapias envolvendo uma maior presença do pai - para que Manuel pudesse se identificar mais com o sexo masculino. 'Mas a criança ficava cada vez mais triste', conta a psicóloga. Até que, aos 4 anos, a mãe resolveu fazer a vontade do filho: passou a chamá-lo de Lulu e tratá-lo como menina. 'Ela acha que tomou a decisão correta, porque antes tinha um menino triste, hoje ela diz que tem uma menina feliz', disse Pavan. Feliz, mas com problemas.

Apesar de Manuel ter sido bem aceito na escola, após mudar sua aparência e nome, ele passava por situações desconfortáveis em qualquer outro espaço público, onde tinha que apresentar um documento de identidade - como na sala de emergência de um hospital, lotada de crianças e seus pais. Com o novo documento, isso não voltará a acontecer.
'Mas Lulu vai precisar de muito acompanhamento psicológico porque, apesar de o Estado ter aceito sua mudança de gênero e nome, ela não é igual às outras meninas. E vai ter que esperar até ser mais velha para fazer tratamentos hormonais ou cirurgias', explicou Pavan. 'Mas espero que esse caso, emblemático ajude outras famílias a ajudar seus filhos a sentirem-se cômodos com quem são'.

A Argentina é pioneira na defesa dos direitos de homossexuais e transexuais. A Lei de Identidade e Gênero também prevê tratamentos com hormônios e cirurgias gratuitas para mudar de sexo em hospitais públicos. Antes mesmo da lei entrar em vigor, em 2011, Angie Beatriz Alvarez - uma agente da polícia de Rosário (no interior da Argentina) conquistou o direito de usar uniforme feminino no trabalho. Também houve o caso da primeira professora transexual da rede de ensino público da cidade de Buenos Aires: Jose D’Oro foi casado e pai de duas filhas mas há seis anos decidiu que preferia ser chamado de Melissa e vestir-se como mulher. A Argentina também foi um dos primeiros países a aprovar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Edição: Fábio Massalli

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3 comentários:

  1. Trata-se, obviamente, de uma questão extremamente complexa e no mínimo curiosa, o oferecimento de um documento que confere mudança de nome a uma pessoa de tão pouca idade: apenas seis anos. Muito embora a legislação argentina seja pioneira no tratamento e reconhecimento de direitos a homossexuais e transexuais, não está bastante claro o posicionamento da psicologia, psiquiatria e da própria filosofia, enquanto ciências que investigam a formação/desenvolvimento da psique. Freud, Yung e Vigotski são exemplares de cientistas que gastaram parte de suas vidas na tentativa de delimitar em que estágio da vida a formação psicológica é forjada. Não se questiona aqui a garantia do direito a afirmação sexual e sim de qual fase de vida essa formação psicossocial se dá e como tratar a temática a luz da ética e do direito

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  2. O fato de o sexo físico não corresponder ao sexo psíquico, muitas vezes é causa de auto rejeição e preconceito, fazendo com que a pessoa sofra exclusão social.

    No intuito de amenizar tal fato, as legislações, em todo mundo, têm se adequado a esta realidade, no sentido de normatizar os direitos de cidadãos transexuais.

    O Brasil acabou por autorizar, em 1997, as cirurgias de trangetalizações, através da Resolução nº. 1.482 expedida pelo Conselho Federal de Medicina.

    Importante ressaltar que, para ser submetido a uma cirurgia de alteração de sexo no Brasil, é necessário que ser maior, capaz e passar por tratamento psicológico de, no mínimo, dois anos.

    Ocorre que, não obstante a legislação brasileira autorize a alteração do sexo e do prenome no registro civil, por meio de autorização judicial, esta só é concedida a transexuais.

    Importante ressaltar que a identificação sexual é considerado um direito da personalidade e, por esta razão, se mostra inviolável e irrenunciável.

    Ora, no caso em tela, em que se trata de uma criança de apenas seis anos com a personalidade (não no sentido jurídico) ainda em formação, não é razoável fazer a alteração do prenome e do sexo no registro civil, já que haverão, ainda, muitas mudanças psíquicas e hormonais até que chegue a fase adulta.

    Assim, entendo ser a legislação do Brasil mais rígida e mais correta no tangente a alteração de prenome e sexo no registro civil, já que se faz necessário ser um transexual que passou por análise psicológica e que possui capacidade de fato.



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  3. O tema em voga acerca da transexualidade apresenta a preocupação no reconhecimento de seus direitos em face do impedimento dos Registros Públicos quanto à alteração do gênero e sexo da pessoa. No caso em tela, o direito à identidade de gênero do transexual será garantida quando tornar possível o desejo de viver e ser aceito como sendo do sexo oposto, tendo em vista que os aspectos biológicos não lhe são agradáveis. O fato da menina ter amparo dos pais desde criança para afirmar a sua identidade sexual tem sido importante para a garantia dos direitos da personalidade e dignidade da mesma, de modo a protegê-la contra as discriminações sociais e reconhecer o direito à alteração do nome e sexo como forma de aceitação pessoal.
    Nesse sentido, a Argentina mostrou grande inovação na legislação que permite aos travestis e transexuais mudarem seus nomes sem precisar recorrer à justiça. A relevância desta postura representa a necessidade de corresponder ao desejo do indivíduo de ter uma vida íntima e social sem constrangimentos, em respeito à identidade sexual vivida. Também ressalta-se que o desenvolvimento psicológico do mesmo irá torná-lo capaz a realizar a cirurgia de transgenitalização no tempo oportuno, como já autorizado no Brasil através da Resolução nº 1955/2010 do CFM.

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