Acesse o nosso site: www.cebid.com.br
Mostrando postagens com marcador Cuidados Paliativos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Cuidados Paliativos. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

A última liberdade


COLUNA
A última liberdade

Dignidade humana deve ser preservada. Do direito à vida não decorre o dever de viver a qualquer preço

O reverendo Desmond Tutu, arcebispo emérito da Cidade do Cabo, Prêmio Nobel da Paz, braço direito de Mandela na luta contra o apartheid na África do Sul, é um ícone mundial da defesa de direitos humanos. Recentemente, Tutu chamou sua filha para conversar sobre um assunto delicado, o fim de sua vida. Anunciou que gostaria, ele mesmo, de escolher quando sua vida se encerraria e em que condições, recusando o prolongamento artificial das funções vitais.
Fez, então, por escrito, a defesa do direito à morte com dignidade, contrariando aqueles médicos que acreditam ser o seu dever prolongar a vida do paciente em quaisquer circunstâncias. “Tive o privilégio de dedicar minha vida à defesa da dignidade dos que estão vivos. Agora quero dedicar minhas energias à luta pela dignidade dos que estão morrendo”. E concluiu afirmando que reivindica para si o direito à morte assistida.
Dois anos antes, o suíço Hans Küng, um dos mais eminentes teólogos católicos, publicara um livro intitulado “Morte feliz”, em que declarava que, chegado o momento, não abrirá mão do direito de decidir serenamente, sob sua inteira responsabilidade, sobre a hora e o modo de sua morte, uma decorrência do princípio do livre-arbítrio. A morte faz parte da vida e, nesse momento extremo, mais do que nunca a liberdade e a dignidade humana devem ser preservadas. Do direito à vida não decorre o dever de viver a qualquer preço.
Hans Küng é membro de uma associação suíça sugestivamente chamada Exit, que ajuda as pessoas que sofrem de uma doença incurável, expostas à degradação física e mental, dolorosa ou incapacitante, a morrer como desejam. Para ele, assim como se ajuda alguém a viver, ajudá-lo a morrer, quando é este o seu desejo, é o ponto extremo da compaixão. O que não se choca com suas convicções religiosas, uma vez que ele se recusa a imputar ao Deus em quem acredita a criação de um inferno em vida.
Desmond Tutu e Hans Küng, dois homens profundamente religiosos, fundamentam suas escolhas no respeito à dignidade humana e na afirmação da liberdade. Esse direito à autonomia interroga a sociedade e coloca um problema eminentemente político. Os imensos progressos da tecnologia aplicados à medicina, ao lado dos indiscutíveis benefícios que trazem, vêm gerando situações de prolongamento artificial da sobrevida que, apagando as fronteiras entre a vida e a morte, fazem com que sejamos obrigados a temer não o dia de nossa morte, e sim os dias de uma morte em vida, um calvário para si mesmo e para os que acompanham a agonia.
O debate sobre o fim da vida está aberto e faz seu caminho nas sociedades democráticas que cada vez mais reconhecem o direito dos indivíduos de viver com dignidade até o fim, de escrever sua história até o ponto final. Nada é mais cruel e injusto do que, em nome de um princípio religioso ou de uma ética médica de outros tempos, impor a um ser humano, já fragilizado e contra sua vontade, dores atrozes, a imobilidade que aprisiona dentro do próprio corpo ou a convivência insuportável com a certeza de que sua mente e, em consequência, sua capacidade de escolha estão se apagando.
O que está em jogo não é só a dignidade de cada um, é a essência mesma de nossa humanidade. Feliz de quem consegue chegar ao fim da vida ainda na posse de suas faculdades mentais, com suas lembranças e afetos intactos, cercado pelos seus entes queridos.
O primeiro passo na direção de um maior respeito à demanda dos pacientes é a atenção cada vez maior que vem sendo dada aos “cuidados paliativo”, à luta contra a dor e o sofrimento percebidos até pouco tempo atrás como uma fatalidade.
Médicos que sempre pensaram que sua missão era garantir a todo custo a sobrevivência dos pacientes vão aprendendo no contato com eles a importância de poderem ser tratados em casa ou atendidos por equipes treinadas para reduzir a dor e o sofrimento, capazes ainda de fazer as pequenas escolhas cotidianas que exprimem seu gosto pela vida.
Ajudar o paciente a lidar com a angústia da morte implica em ouvi-lo. E ouvi-lo inclui a possibilidade de que ele peça ajuda para morrer. Ou para continuar vivendo até o fim.
Os cuidados paliativos exprimem escuta e respeito ao desejo dos pacientes mas não respondem à questão de fundo: o poder de decisão não pode mais estar nos médicos, por melhor intencionados que sejam, e sim na vontade soberana do paciente. A morte com dignidade tem que entrar na pauta das liberdades que se ampliam e são reconhecidas como direitos garantidos em lei. Morrer dignamente é a ultima liberdade.
Rosiska Darcy de Oliveira é escritora





------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Morte de atriz chinesa abre debate sobre terapias alternativas no tratamento do câncer

16/09/2016 16h45 - Atualizado em 16/09/2016 16h45

Morte de atriz chinesa abre debate sobre terapias alternativas no tratamento do câncer

Diagnosticada com linfoma, Xu Ting recorreu à medicina tradicional chinesa em detrimento da quimioterapia.

Da BBC

Atriz foi diagnosticada com linfoma, tipo de câncer que afeta o sistema imunológico (Foto: reprodução/Weibo)Atriz foi diagnosticada com linfoma, tipo de câncer que afeta o sistema imunológico (Foto: reprodução/Weibo)







No início deste ano, a atriz chinesa Xu Ting foi diagnosticada com linfoma, um tipo de câncer que afeta o sistema imunológico. Mas a artista de 26 anos decidiu não se submeter à quimioterapia porque, segundo afirmou na ocasião, achava o tratamento excessivamente caro e doloroso e temia seus efeitos colaterais.
"Não quero que a quimioterapia me atormente e me afete a ponto de eu ficar irreconhecível, de perder todo o meu dinheiro e minha própria essência", escreveu ela em seu blog.
Ela recorreu, então, à medicina tradicional chinesa.
Agora, a morte da jovem gera um debate naChina sobre a eficácia desse tipo de procedimento para tratar o câncer.
Curas que não curam
A atriz tornou pública sua doença em julho deste ano em sua página na rede social Weibo, com 300 mil seguidores.

Desde então, ela documentou todo o processo na internet.
Constantemente, Xu publicava fotos de si mesma sendo submetida a diversas terapias, dando uma amostra dos métodos da medicina tradicional de seu país - ventosaterapia, acupuntura, alongamento de coluna e um método chamado "gua sha", que consiste em raspar a pele para produzir pequenos hematomas.
Já a ventosaterapia consiste em acender líquido inflamável dentro de copos redondos de vidro. Uma vez que a chama se apaga, forma-se um vácuo parcial no interior do copo.
A diferença entre a pressão interior e exterior acaba por gerar uma força de sucção, estimulando o fluxo sanguíneo e deixando os círculos vermelhos, que desaparecem entre três e quatro dias.
Gua sha é um tratamento da medicina tradicional chinesa que consiste em raspar a pele para produzir pequenos ferimentos; acredita-se que isso estimule o fluxo sanguíneo e a cura (Foto: reprodução/Weibo)Gua sha é um tratamento da medicina tradicional chinesa que consiste em raspar a pele para produzir pequenos ferimentos; acredita-se que isso estimule o fluxo sanguíneo e a cura (Foto: reprodução/Weibo)
Quando sua doença começou a piorar, a atriz chinesa decidiu por fim aderir à quimioterapia, mas morreu no dia 7 de setembro, pouco depois de iniciar o tratamento, informou o jornal britânico The Guardian.
'Fantasiosas'

Milhares de pessoas nas redes sociais acompanharam o calvário de Xu pelos tratamentos tradicionais, e muitos lhe pediram que recorresse à medicina ocidental.

"Preste atenção, a medicina chinesa é completamente inútil na batalha contra o câncer, procure um médico", opinou um seguidor de Xu Ting.
Outro fã disse: "Deixe de lado os tratamentos tradicionais, são uma fantasia. O que você precisa é de uma medicina contemporânea se você quer se salvar".
A atriz respondeu que trabalhou muito durante toda a sua vida para pagar os estudos de seus seis irmãos, as dívidas de seus pais e uma casa.
Xu acrescentou que nunca se sentiu confortável gastando dinheiro consigo mesma.
Atriz deixa pai, mãe e seis irmãos (Foto: reprodução/Weibo)Atriz deixa pai, mãe e seis irmãos (Foto: reprodução/Weibo)







Depois da notícia da morte de Xu, as redes sociais chinesas foram inundadas por comentários.
No Weibo (conhecido como o Twitter chinês), a hashtag #XuTing'sDeathAndChineseMedicine (#MortedeXuTingeeMedicinaChinesa) ficou entre as mais compartilhadas.
Alguns usuários que participaram do debate defenderam que a medicina chinesa não deveria ser considerada culpada pela morte da atriz.
"Há muitos pacientes de câncer que morrem depois da quimioterapia. Nesse caso, vão dizer que a medicina ocidental também é uma farsa?", assinalou um jornalista de uma rede de TV de Pequim.
"A medicina chinesa tem milhares de anos. Nem tudo o que os médicos ocidentais dizem é verdade", acrescentou outro usuário.
O chefe do departamento de medicina tradicional chinesa da Academia de Ciências Médicas de Pequim, Feng Li, afirmou que a prática milenar poderia ter sido usada para aliviar os sintomas de um tratamento ocidental: "Enquanto abordagens ocidentais como radiologia, quimioterapia e cirurgia são eficazes em reduzir tumores, as terapias chinesas ajudam a combater enjoos, vômitos e dores decorrentes."
O Guardian compilou artigos científicos sobre o assunto na China e identificou uma pesquisa de 2014 mostrando evidências "pequenas a moderadas" de que tratamentos alternativos, incluindo os chineses, podem aliviar dores decorrentes de tumores.
Entre as diversas técnicas, Xu Ting recorreu à ventosaterapia (Foto: reprodução/Weibo)Entre as diversas técnicas, Xu Ting recorreu à ventosaterapia (Foto: reprodução/Weibo)























------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Ana Claudia Quintana: a médica que prescreve poesia na lida diária com a morte




Ana Claudia Quintana: a médica que prescreve poesia na lida diária com a morte

Ana Claudia Quintana Arantes

“Todos são portadores de felicidade.Uma pena notar que boa parte da humanidade ainda é assintomática.”

A médica que prescreve poesia na lida diária com a morte
- Por Paulo Hebmüller, do Jornal da USP, especial para o USP Online

Um paciente alcoólatra, vítima de cirrose e câncer, com a barriga inchada pela doença e a pele tão amarelada a ponto de a estudante de Medicina que foi visitá-lo fazer a comparação com a cor de um canário. Muitos anos depois, ainda é no seu Antônio, o paciente que lhe coube entrevistar no Hospital Universitário (HU) da USP, que a médica Ana Claudia Quintana Arantes identifica o ponto de partida para sua trajetória na área de cuidados paliativos – uma disciplina pouco difundida e que continua cercada por preconceitos no Brasil.

Angustiada porque seu Antônio não conseguia contar sua história – as dores eram grandes demais –, a então terceiranista da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) procurou o professor para saber se havia algum remédio que pudesse aliviá-lo. “Ele fez uma cara de irritado e disse: ‘Eu já tinha dito que era um paciente terminal. Você sabe o que é um paciente terminal?’ Eu disse que sim, mas que ele estava com dor. Aí o professor falou que não tinha nada para fazer”, conta Ana Claudia. “‘Não? Ele está morrendo de dor. Não tem nada para aliviar a dor agora?’ Aí ele respondeu que não, que se eu desse o remédio para dor o fígado não aguentaria. Eu perguntei: ‘Mas você não está me dizendo que não tem mais jeito? Que diferença faz salvar o fígado dele porque não demos analgésico?’ Bom, tomei uma baita de uma cravada…”
“Cuidados paliativos não são abandono; pelo contrário, nós dobramos a escala do paciente.”
É com base em histórias como essa que a médica acredita que sua opção pelos cuidados paliativos “veio pela dor”. Aliás, diz, “a maior parte dos profissionais que trabalham com isso deve a escolha à vivência de uma situação difícil”. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os cuidados paliativos são uma abordagem que melhora a qualidade de vida do paciente e de sua família em caso de doenças que ameacem a continuidade da vida. Eles incluem a avaliação e o controle de forma impecável não somente da dor, mas de todos os sintomas de natureza física, social, emocional e espiritual.

Em outras palavras, os cuidados paliativos focam o conforto e o bem-estar do paciente e dos familiares quando se sabe que a doença não responde mais aos tratamentos convencionais e levará ao desfecho inevitável. Eles representam o contrário da obstinação terapêutica, em que todos os recursos tecnológicos são utilizados para manter a sobrevida – num quadro que, não raro, se traduz numa pessoa inconsciente cujas funções orgânicas só se sustentam porque ligadas a aparelhos. É por essa razão que profissionais de várias correntes defendem que a obstinação terapêutica – ou distanásia – nada tem a ver com prolongamento da vida, mas sim com mero adiamento artificial da morte, causando ainda mais sofrimento ao paciente e à família.

Enquanto nos Estados Unidos existem mais de dois mil programas de cuidados paliativos, no Brasil eles são pouco mais de 30. É bom, entretanto, não confundi-los com as estratégias de “humanização” apregoadas pelos grandes hospitais, alerta a médica. “Humanização é aparência, uma coisa ligada ao discurso corporativo. Os cuidados paliativos trazem humanidade”, defende. “Não se pode pensar num profissional da área que não seja uma pessoa muito boa no que faz. Tem que buscar o melhor em termos de formação, de conhecimento técnico e de atualização, mas tem que ter o coração envolvido.”
“O estado de amorosidade do ser humano deveria se tornar algo como a temperatura ou o pH do sangue: perene, necessário ao bom funcionamento de todos os nossos sistemas, internos e externos.”

Ana Claudia vai lançando suas sementes para tentar envolver mais corações. Formada em 1993, fez residência em Geriatria e Gerontologia no Hospital das Clínicas da FMUSP, pós-graduação em Intervenções em Luto pelo Instituto 4 Estações de Psicologia e especialização em Cuidados Paliativos pelo Instituto Pallium e Universidade de Oxford, na Inglaterra.

Em 2007, criou em São Paulo, ao lado de três colegas, a Casa do Cuidar, organização voltada para a prática e ensino de cuidados paliativos. “Está cheio de gente morrendo mal”, justifica, e avisa: “quando chegar a minha vez, quero alguém que me cuide direito, porque eu vou dar trabalho”

Linhas pares, de Claudia Quintana
Trabalho, por sinal, é o que não falta a esta leonina de 43 anos que se realimenta lendo e escrevendo. Seu blog Prescrição de Poesia (Pérolas da Ana) é a origem do livro de poemas Linhas Pares (Scortecci Editora, 2012), que Ana lança no próximo sábado, (12) de maio, a partir das 15 horas, na Livraria da Vila (Rua Fradique Coutinho, 915, Vila Madalena, São Paulo).

O volume, ela assina como Claudia Quintana – poeta “tão mais doce e feliz do que a doutora Ana” –, numa apropriada coincidência de sobrenome com Mario Quintana, um de seus autores preferidos.

Os muitos ensinamentos a respeito da vida que os anos de trabalho intenso com pessoas tão próximas da morte lhe trouxeram são um dos temas da entrevista com a médica poeta, que você lê na entrevista completa AQUI!
-----











------------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

terça-feira, 3 de novembro de 2015

O Dia Mundial de Cuidados Paliativos tem o que comemorar no Brasil?

O Dia Mundial de Cuidados Paliativos tem o que comemorar no Brasil?

POR CAMILA APPEL
07/10/15  15:46


Ana Claudia Arantes, médica especialista em cuidados paliativos, recebeu os resultados do novo ranking publicado pela revista “The Economist”(organizado pela consultoria britânica Economist Intelligence Unit – EIU), sobre a qualidade do morrer mundo afora, com pouca euforia. Dentre os 80 países analisados, o Brasil ficou em 42° lugar.
A notícia chega perto do Dia Mundial de Cuidados Paliativos (em inglês:World Hospice and Palliative Care Day), uma data para celebrar e oferecer suporte a hospices e cuidados paliativos ao redor do mundo. Ela ocorre todo segundo sábado de outubro e sua temática varia. Nesse ano, a data é 10 de outubro, com o tema “vidas esquecidas, pacientes ocultos”. Como consta em seu site oficial, o tema refere-se a pacientes que normalmente vivem em condições de difícil acesso a cuidados paliativos, como “crianças, indivíduos LGBT, prisioneiros com HIV, soldados e habitantes rurais”.
Essa definição não faz sentido ao pensarmos na situação brasileira, pois a nossa falta de acesso certamente não se reduz a esse público e sofremos uma importante carência de políticas públicas que estimulem não só a acessibilidade a tratamentos e opióides (como morfina), mas também à formação de profissionais. O ranking da “The Economist” divulgado nessa segunda-feira (5) aponta para esse problema.
Foi levado em consideração o ambiente de cuidados paliativos, recursos humanos (formação dos profissionais na área), sua acessibilidade, qualidade do cuidado e nível de engajamento da comunidade. Para a organização do ranking, utilizaram-se dados oficiais, pesquisas existentes e entrevistas com profissionais da área. Para o estudo do Brasil, apenas Maria Goretti Salles Maciel, (presidente da ANCP .Academia Nacional de Cuidados Paliativos) foi entrevistada. Maria conta que, quando foi entrevistada para o estudo, ela informou que não temos dados oficiais sobre cuidados paliativos. Ela diz acreditar que a posição do país melhorou em relação ao último ranking (de 2010, no qual o Brasil ocupou a posição 38 entre 40 países avaliados), apesar de a nossa situação ainda ser muito caótica. Essa posição seria melhor caso tivéssemos dados oficiais para divulgar. “De qualquer forma, ainda estamos muito aquém do que poderíamos, e ainda concentrados em grandes centros urbanos. A grande maioria dos municípios brasileiros nem tem notícias sobre o que é cuidados paliativos”, ela diz. Nossos maiores desafios seriam o acesso a medicamentos para dor, formação e capacitação de profissionais (que deveria ser ensinado na graduação) e termos políticas públicas voltadas para o tema.
Para Maria, não temos o que comemorar nesse Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, mas sim refletir e arregaçar as mangas. “Parece que estamos um pouco melhor, mas é só uma questão de mudança na forma de avaliar. E talvez porque nesse segundo ranking eles tiveram mais informações”, comenta.
O estudo indica que estamos no processo de desenvolver nossas próprias políticas nacionais. Em contrapartida, países como Colômbia, Equador, Itália, Rússia, e Japão já teriam evoluído no sentido de estabelecer novas ou melhores linhas de atuação, leis ou programas nacionais.
Na América Latina, o Brasil perde para Chile (27º), Argentina (32º), Uruguai (39º) e Equador (40º).
As principais conclusões dessa publicação foram:
  • O Reino Unido apresenta a melhor qualidade de morte e países ricos tendem a ocupar melhores posições no ranking (em segundo lugar está Austrália, seguida por Nova Zelândia. Nos últimos dois lugares temos Bangladesh e Iraque);
  • Países com melhor qualidade de morte compartilham algumas caraterísticas, como uma política nacional de cuidados paliativos, altos gastos públicos em serviços de saúde, treinamento extensivo para os profissionais envolvidos, grande oferta de opióides (morfina é um exemplo deles) e forte consciência pública sobre cuidados paliativos;
  • Políticas nacionais são vitais para o aumento de acesso a cuidados paliativos;
  • Treinamento de todos os médicos e enfermeiros é essencial para acompanhar a crescente demanda;
  • Subsídios são necessários para que o tratamento seja acessível;
  • A qualidade do tratamento depende do acesso a opióides, analgésicos e suporte psicológico;
  • Esforços da comunidade são importantes para aumentar a conscientização e estimular conversas sobre a morte. Um exemplo oferecido é a iniciativa mundial “Death Cafe” (veja post do blog  Um Death Cafe em São Paulo) – aqui o estudo cita o Brasil de forma positiva.
  • A área de cuidados paliativos precisa de investimento, mas oferece uma otimização de custos (leia sobre o assunto em: “Entrevista com Maria Salles Goretti Maciel”).
Ana Claudia considera que toda a rede de hospitais públicos deveria ter leitos destinados aos cuidados paliativos. E a formação na área poderia ser incluída na grade curricular da graduação de medicina e enfermagem – ao invés de ser apenas uma área de atuação como é hoje. Ela também diz que a rede privada deveria usar os cuidados paliativos como um acréscimo em  qualidade de atendimento e melhora de gestão de tratamentos.
De qualquer forma, temos avanços na área, como a existência da própria estrutura de hospices, apesar de em baixo número e pouco divulgada e a existência de uma área de atuação reconhecida. No entanto, alguns médicos atuantes nesse setor, como Maria Salles Goretti Maciel e Dalva Matsumoto, consideram que cuidados paliativos deveria ser uma especialidade médica. (Leia mais sobre o trabalho delas: Um dia numa hospedaria de cuidados paliativos e Um dia numa enfermaria de cuidados paliativos).
Veja abaixo, eventos programados para celebrar o Dia Mundial de Cuidados Paliativos no Brasil.
EVENTOS
Instituto Paliar – Jornada de Conscientização em Cuidados Paliativos
Descrição: Um dia inteiro com oficinas educativas sobre cuidados paliativos, ministradas por médicos especialistas no assunto, além de psicólogos, enfermeiros e outros profissionais da saúde. Uma das palestrantes é Maria Salles Goretti Maciel, entrevistada pelo estudo da “The Economist”. Palestras: Definições e conceitos, o trabalho do enfermeiro, comunicação no final da vida, reabilitação em cuidados paliativos, ética e justiça no final da vida e abordagem do sofrimento psíquico da família, paciente e equipe.
Data: 07 de novembro de 2015 Local: Faculdade São Camilo Custo:R$20,00 para alimentação e bebidas.
O evento é aberto ao público em geral, não apenas a profissionais da saúde.
Informações: (11) 5051 0555 / 3675 5697 ou contato@paliar.com.br




-------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

terça-feira, 27 de outubro de 2015

É melhor morrer em casa ou no hospital?

É melhor morrer em casa ou no hospital?

POR CAMILA APPEL
08/10/15  15:51
Morrer em casa é mais pacífico e gera menos sofrimento tanto para o paciente quanto para os que o amam, mas demanda um suporte mais amplo. A conclusão é de um estudo divulgado nesta quinta-feira (8) pelo jornal médico da BioMed Central (BMC).
Há fatores determinantes para esse cenário: ter suporte familiar, acesso a cuidados paliativos domiciliar e à enfermagem comunitária. O estudo indica que devem ser criadas políticas públicas que garantam essas condições e assim, melhorar a qualidade de morte das pessoas.
Outros elementos aumentariam a chance de uma morte em casa, como a consciência familiar de uma doença sem cura, a discussão das preferências do paciente e a quantidade de dias de licença do trabalho que os parentes tiveram nos últimos três meses de vida do familiar.
Um exemplo é a situação existente em países como Canadá, Holanda, Noruega e Suécia, que desenvolveram programas sociais semelhantes à licença-maternidade para oferecer suporte às famílias que querem cuidar de seus parentes no final da vida.
O estudo, realizado em Londres, indica cuidado ao ser reproduzido para outras regiões com menos acesso às condições mencionadas acima, como é o nosso caso.
Mas é interessante observar que seu resultado trouxe uma preferência da população pela morte domiciliar, tendência já verificada em países como Estados Unidos e Canadá. Ao passo que no Japão, na Alemanha, em Portugal e na Grécia, a “morte institucionalizada” (como se refere o estudo, e quer dizer morte no hospital) é mais escolhida.
A autora principal do estudo, Barbara Gomes, diz que muitos pacientes temem morrer em casa para não serem um fardo para sua família, mas seu estudo encontrou evidências de que o sofrimento de morrer em casa é menor para a família também.
E no Brasil?
Reportagem desse ano da Folha indica o aumento de atendimento domiciliar na área da saúde (de uma forma geral), tanto na rede privada quanto na pública. Em relação à pública, o artigo constata: “Em 2012, o país tinha 184 equipes cadastradas para atender pacientes por meio do programa Melhor em Casa. Hoje, são 794. Apesar do aumento, a iniciativa não atingiu a meta, que era chegar a mil equipes até 2014. O Ministério da Saúde diz que habilitou outras 761 equipes, que dependem da iniciativa das prefeituras e Estados”.
Vou retomar algumas das entrevistas feitas no blog, pincelando comentários sobre a questão específica desse post.
A médica especializada em cuidados paliativos Milena Reis considera que morrer em casa, ao lado de quem se ama, seria o ideal. Mas ela destaca que isso pode ser complicado, porque algumas famílias não têm estrutura emocional para cuidar de um doente terminal, ou mesmo física. Ela dá o exemplo de um caso em que a cadeira de rodas do paciente não passava pela porta de entrada do apartamento. O alto custo de um “home care” também seria um fator limitante. Milena faz um paralelo entre parto humanizado e a morte em casa. Na medida em que começamos a discutir um, poderíamos passar a discutir o outro. Por que não colocar em pauta as condições necessárias para uma morte domiciliar? Quais políticas públicas precisariam ser desenvolvidas?
O geriatra Paulo Camiz considera que o maior medo dos mais velhos é sentir dor e solidão. Ele comenta que alguns usam frases como “ter medo de ser abandonado” e de “dar trabalho”. Paulo diz: “Quando uma pessoa está morrendo, tudo o que ela não quer é ficar sozinha e tudo o que os familiares mais fazem é deixá-las sozinhas. Vejo muito isso. Nos principais hospitais, boa parte dos pacientes que estão na UTI não precisariam estar lá. Mas é mais cômodo para o médico, porque tem um plantonista 24h a disposição para cuidar daquele paciente. A UTI facilita essa solidão, ela é muito desconfortável para visitas”.
Maria Goretti Salles Maciel, médica presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), diz que “não dá para ser muito romântico. A morte em casa pode ser uma morte boa, desde que você tenha acesso a uma assistência domiciliar, o que nem sempre é verdadeiro. Essa assistência seria um bom apoio da família e de bons profissionais. Meu pai morreu em casa. Mas eu estava lá e assumi os cuidados dele. Eu não sei se eu gostaria de morrer em casa não… Talvez para meus filhos seria mais prático eu morrer num hospital”.
Para a jornalista Eliane Brum, o importante é não se trocar um tabu pelo outro, um imperativo pelo outro – e defender que morrer em casa é melhor do que no hospital, por exemplo. “Passamos boa parte do século 20 silenciando sobre a morte, e agora, quando ela começa a ser falada, seria muito triste que se criassem outros dogmas para isso. Eu não acho que tem um jeito certo ou errado de morrer. Tem o jeito de cada um. Algumas pessoas acham melhor morrer em casa, cercadas pelas pessoas que amam, pelos objetos que fazem parte do seu mundo, contando histórias e ouvindo histórias. Outros vão achar melhor morrer no hospital. Tem quem vai tentar tratamentos invasivos, mesmo sabendo que há pouca ou nenhuma chance de ter resultado, outros vão preferir não. O importante é que os desejos sejam respeitados, que esse último ato da vida de alguém seja vivido nos termos dessa pessoa. Que a pessoa possa escolher e não que escolham por ela”.
O artigo será disponibilizado nesse link com acesso gratuito:



-------------------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Cuidados paliativos: entrevista com Ana Claudia Quintana Arantes

Cuidados paliativos: entrevista com Ana Claudia Quintana Arantes

POR CAMILA
15/09/15  07:54
A médica geriatra Ana Claudia Quintana Arantes é formada em cuidados paliativos pelo Instituto Palio (na Argentina) e pela Universidade Oxfort. Em 2007, ela foi uma das fundadoras da Casa do Cuidar, instituição voltada para a prática e o ensino em cuidados paliativos. Ana Claudia tem um consultório no Hospital Albert Einstein e coordena o hospice do Hospital das Clínicas, fundado em dezembro de 2011. São dez leitos subsidiados pelo SUS, localizados no hospital particular Recanto São Camilo – no bairro Jaçanã, Zona Oeste de São Paulo. Os pacientes, de 16 a 99 anos, vivem em media 15 dias. 70% apresenta câncer avançado.
Toda segunda-feira, uma equipe multiprofissional se reúne para discutir caso a caso de forma integrada. São médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, nutricionista, fonoaudiólogos, farmacêuticos e um capelão.
Segundo Ana Claudia, hospice é “uma filosofia de cuidados e um local onde é oferecido a assistência plena de cuidados paliativos”.
Seu discurso no TED, “a morte é um dia que vale a pena viver” tem mais de 600 mil visualizações. Seus cursos e palestras, direcionados a estudantes de medicina e ao público em geral, lotam. Ela considera que está fortalecendo-se como uma porta-voz da causa porque tem sido ouvida de uma forma muito interessada. “As pessoas podem não querer falar sobre a morte, mas elas estão querendo ouvir”, diz.
Conversamos sobre conceitos, preconceitos, dificuldades, últimos desejos e o processo da morte em si. Confira abaixo.
O que são cuidados paliativos?
É a assistência integral que será oferecida a pessoas com doenças graves que ameacem a continuidade da vida. Não é um risco iminente de vida, mas significa que aquela doença pode ser a causa de morte da pessoa. Há tempos de atuação dos cuidados paliativos. Na fase de diagnóstico da doença, por exemplo, o paliativo vai atuar mais como um suporte clínico, ajudando o paciente a dar conta do tratamento, especialmente em casos de câncer – por que no câncer você começa o tratamento de forma muito agressiva, para controlar a doença.
Num segundo momento, há o cuidado paliativo exclusivo, em casos de não melhora da doença ou em pacientes sem condições clínicas de fazerem um tratamento. Mas esse momento exclusivo pode significar uma expectativa de vida de horas ou de anos.
Que preconceitos precisam ser quebrados?
O preconceito de conversar sobre a doença, sobre a morte. De achar que falar a verdade mata. Alguns familiares pensam que se o parente souber a verdade, ele vai morrer, ele não vai aguentar. Mas o paciente pode se sentir abandonado e traído caso você se recuse a contar. A verdade não é uma obrigação, mas é um direito do paciente. A comunicação de más notícias faz parte da formação dos cuidados paliativos.
Também há o preconceito de que cuidado paliativo é desistir do paciente. Não somos a arte de suspender tratamentos, e sim de ampliar o cuidado para uma pessoa que está em extremo sofrimento devido a uma doença que não tem cura. A gente vai fazer intervenções para promover o conforto do paciente.
Há dificuldades em se ter um diagnóstico correto para encaminhar um paciente aos cuidados paliativos?
De jeito nenhum. Isso é má vontade médica. Há um documento da OMS (Organização Mundial da Saúde) com todos os critérios de indicação de pacientes para cuidados paliativos. Por exemplo, paciente com câncer metastático ou inoperável, doença cardíaca de classe funcional de 3 para 4, paciente com doença coronária obstrutiva crônica classe 3, paciente com demência classe 7… Isso é para atendimento de cuidado paliativo exclusivo, não é nem indicação de paliativo.
Alguns médicos mandam o paciente para paliativo para gerenciarmos problemas familiares, por termos fama de resolver bem conflitos. Algumas vezes já fui chamada na UTI para intermediar conflitos entre equipes, entre a família e a equipe ou dentro da família.
Qual é a diferença de um paciente que recebe cuidados paliativos para o que não o recebe?
O paciente que não recebe é tratado como uma doença. O que recebe é tratado como uma pessoa. Essa é a diferença essencial. Se eu olhar para você só como um câncer de mama avançado, eu me frustro. Porque sua doença não tem cura, você não está respondendo ao tratamento e você não passa de um câncer avançado. No olhar do cuidado paliativo, você passa a ser um ser humano, parte de um núcleo familiar e de um núcleo afetivo, que tem sonhos expectativas.
Na prática, significa a não intubação ou não ser ressuscitado, por exemplo?
Não necessariamente. Cuidado paliativo não deixa de fazer intervenções. A gente faz uma intervenção quando ela faz sentido para a qualidade de vida do paciente. Pensamos no objetivo do cuidado. Pensamos no momento presente. O paciente não tem tempo para desperdiçar com expectativas infundadas. Nos preocupamos com o conforto imediato dele.
Mas conversamos sobre objetivos e cuidados, que seria o testamento vital ou as diretrizes antecipadas de vida – o que o paciente espera do momento que ele está vivendo, o que ele espera de mim, o que espera do tratamento, e alinhamos as expectativas. Nesse momento, ele pode optar por não ter suporte artificial à vida, por exemplo. Não é automático, não seguimos protocolo.
Em alguns casos, eu indico uma intervenção, em outros não. Por exemplo, indiquei uma diálise, que é um procedimento muito desconfortável e com efeitos colaterais, para um paciente em final de vida porque ele gostaria de viver um pouco mais para conhecer o neto que nasceria em dois meses. Não se tratava de prolongar a vida a qualquer custo e com sofrimento. Havia um objetivo. Ele viveu três meses, viu o neto e realizou-se.
Como decidiu pelos cuidados paliativos?
Durante a faculdade (USP), sofri muito ao perceber que os médicos se importavam com as doenças e não com as pessoas. O sofrimento delas não era olhado. Até fui encaminhada a um grupo de suporte psiquiátrico para os alunos. Teve uma psicóloga que disse que eu não tinha condições de ser médica, por me envolver demais. Parei a faculdade, fiquei seis meses fora e fui trabalhar de caixa numa loja de departamentos para ajudar nas contas de casa. Mas eu não conseguia viver fazendo outra coisa. Voltei e me dediquei a pesquisar o que eu poderia fazer para aliviar o sofrimento das pessoas.
Decidi fazer geriatria porque eu achava que na geriatria a morte poderia ser mais aceita. Não encontrei bem isso, mas encontrei algo muito precioso que foi o aprendizado de trabalhar em equipe. Porque não são todos os médicos que trabalham em equipe. Eu li o livro da psiquiatra Elisabeth Kubler-Ross (1926-2004), “Sobre a Morte e o Morrer”, que me inspirou para buscar uma formação em cuidados paliativos. Estudei no Instituto Palio, na Argentina, e na Universidade de Oxfort, porque no Brasil não haviam cursos disponíveis. Fiz uma especialização em luto com a equipe do 4 Estações e fui contratada pelo Einstein para implementar as políticas de assistência à dor e cuidado paliativo com o suporte da Joint Commission – instituição americana que fornece certificado de qualidade na assistência.
Aí, vim trabalhar no hospice do Hospital das Clínicas. Para mim, um hospice é o tratamento top de linha em cuidados paliativos. Porque numa enfermaria eu não consigo usar toda equipe, aqui sim.
Quais são as conquistas dos cuidados paliativos até agora no Brasil?
 Ainda é cedo para falar em conquistas. Mas o hospice é uma. O mundo público começa a ter noção da importância e da qualidade que essa assistência pode oferecer a essas pessoas. O mundo privado também começa a reconhecer nessa assistência a possibilidade de qualidade e de uma boa gestão de custos.
O gerenciamento dos recursos nas mãos do cuidado paliativo é muito mais efetivo. Porque eu vou oferecer aquilo que o paciente precisa e tratar outras questões, como as espirituais e emocionais, que melhoram as condições clínicas do paciente, e assim, otimizam recursos.
Quais são as limitações de ser considerada uma área de atuação e não uma especialidade médica?
Eu acho que a especialização deveria ser uma consequência e não um objetivo. Tinha que ser parte da formação de todo médico. Tem que estar na grade curricular, porque o médico não tem que ser especialista em doença, tem que aprender a tratar gente. Para você tratar doenças, às vezes é considerado um empecilho o fato de ser uma pessoa que está doente.
O você acha das clínicas privadas focadas em cuidados paliativos?
Grande parte das clínicas privadas estão se aproveitando de uma certa moda de cuidados paliativos, mas de modo algum o praticam. Muitos desses médicos nem formação na área têm. Às vezes fizeram uma aula, participaram de um congresso e já se dizem especialistas. A equipe que trabalha com eles também não faz ideia do que seja. Se tiver formação, tudo bem, é cuidado paliativo, se não tem qualificação técnica para isso, não é. Isso é ruim porque dissemina a má prática médica.
Porque há poucos hospices no Brasil?
 No Brasil, as pessoas agem como crianças brincando de esconde-esconde. Tapam os olhos com as mãos e pronto, estamos escondidos. É o princípio de que se eu não te vejo, você não me vê. Essa é a perspectiva que o brasileiro, a cultura brasileira, tem da morte. Se eu não olho para a morte, ela não me vê.
O uso de morfina é uma discussão?
Sim. Tem uma instituição que estuda o consumo de morfina prescrita per capita no planeta. O país que mais prescreve morfina é a Áustria – 100 mg per capita. Em segundo lugar, está o Canadá, com 70 mg. A média mundial é de 6,5 mg per capita. No Brasil é 1,5 mg per capita.
Isso é bom ou ruim?
 Péssimo. Porque aqui as pessoas morrem com muita dor. Não se usa morfina porque ninguém aprende a usar. Há má formação e o preconceito de que morfina vai dar depressão respiratória, de que ela vicia. Estudos populacionais do uso morfina indicam menos de 0,01% de risco de vício. Essas poucas pessoas que ficam adictas já eram adictas a outras coisas. Elas tinham um perfil de predisposição. No Brasil as pessoas morrem mal e urrando de dor.
Porque você diz que aqui é um país ruim para se morrer?
A “The Economist” fez um estudo em 2010 sobre a qualidade do morrer em 40 países. O Brasil ficou em 38º lugar. Eles levaram em consideração o número de leitos para cuidados paliativos disponíveis nos hospitais, a existência de estruturas com hospices, formação na faculdade e horas de treinamento.
Vocês satisfazem últimos desejos aqui?
É nossa especialidade! As pessoas pensam que os últimos desejos são complexos, como pular de paraquedas, mas na verdade eles são simples. Os pacientes pedem para ver o neto, o cachorro, comer o prato predileto, tomar um refrigerante, comer pastel na feira, brindar com champanhe. São coisas da experiência humana. Temos histórias lindas.
Gosto de um poema do Manoel de Barros em que ele diz: tem histórias que são tão verdadeiras que parecem inventadas.
Há algum aspecto não cultural na morte?
Acho que o não cultural é, para mim, a necessidade de conforto físico. Isso independe da cultura. Acho também que a amorosidade no final da vida é semelhante a todo ser humano. E a vontade perdoar e ser perdoado.
Vejo esse processo muito claramente na dissolução dos quatro elementos. Em primeiro lugar, temos a dissolução da terra, que é o adoecimento do corpo. Quando você se percebe muito doente, você passa para uma introspecção, para a busca da sua essência. Essa introspecção caracteriza a dissolução da água. Fisicamente, se traduz numa redução de líquidos corporais ao pé da letra (você faz menos xixi, toma menos água, tem menos produções de líquidos gástricos, a pele fica mais seca e o corpo emagrece). Do ponto de vista de comportamento, a pessoa torna-se mais quieta. O acesso a essa pessoa vira um privilégio da família ou da família escolhida, porque há a vontade de ter apenas os mais íntimos por perto. Nessa busca da essência, você vai ter a dissolução do fogo. Cada uma das células do corpo busca fazer o melhor que pode, desempenhar sua função ao máximo. Aí há uma repentina melhora do quadro clínico do paciente. É a famosa visita da saúde – a melhora antes da morte. Em algumas situações vai dar febre, principalmente se a pessoa tiver inconsciente.
O paciente consciente vai expressar sua essência, que eu acredito ser a amorosidade. A gente passa a vida tentando esconder isso. Quando ele encontra essa essência, eu digo que ele encontra o que tem de sagrado nele e aí começa a dissolução do ar, que é a devolução do sopro vital. A gente devolve para o universo o sopro que foi emprestado quando nascemos. Pode demorar horas ou dias.
………..
OBS: Ana Claudia me mostrou uma música que aproveito para incluir nessa entrevista. Gilberto Gil canta “não tenho medo da morte, mas sim medo de morrer”. Veja a letra aqui e o vídeo abaixo.






---------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito

terça-feira, 29 de setembro de 2015

La esperanza, en la terapia génica

Noticias / ACTAYS

La esperanza, en la terapia génica

DÍA 15/09/2015 - 11.48H

La pequeña Isabel padecía Tay-Sachs, una enfermedad rara que aqueja a uno de cada 360.000 nacidos. Hoy su madre lidera una asociación para plantar cara a esta extraña dolencia

«Isabel dejó de hablar a los tres años. Nunca pude tener con ella una conversación en la que me contara cuáles eran sus sueños: si quería ir a Harvard, si estudiaría Medicina o si lo que realmente le apasionaba era jugar al tenis». Son palabras de Beatriz Fernández, una almeriense que perdió a su hija el año pasado. La pequeña Isabel sufría Tay-Sachs, una de esas dolencias raras o poco frecuentes en las que, cuenta, «cuando te dan el diagnóstico, te dan el pésame».
En concreto, Tay-Sachs es una enfermedad neurodegenerativa y de origen genético que afecta principalmente a bebés y niños. Se produce por la falta de hexosaminidasa A, una enzima cuya tarea es reciclar las toxinas que la actividad cerebral va dejando. Al fallar esa función, las toxinas se van acumulando en el cerebro y causan un daño irreversible. «Hay que ir respondiendo a las necesidades de cada niño, saber lo que va a suceder para anticiparse y poder proporcionar los mejores cuidados», señala el doctor Ricardo Martino, pediatra y coordinador de la Unidad de Cuidados Paliativos Pediátricos del Hospital Niño Jesús.
La persona afectada va perdiendo de forma progresiva todas sus facultades: «Va a tener epilepsia, problemas para comer y beber y pérdida progresiva de la movilidad», detalla el doctor Martino. No es de extrañar que estos niños sean totalmente dependientes de sus padres y tengan unacorta esperanza de vida: no suelen superar los 5 años de edad. Y es que, tal y como cuenta este pediatra, «la inmovilidad progresiva y la medicación que necesitan para no convulsionar contribuyen a que parezcan problemas respiratorios».
En la actualidad existen 13 casos detectados en España –el año pasado había 16, pero fallecieron tres–. En realidad, los expertos piensan que son muchos más. Pero se trata de una dolencia muy difícil de diagnosticar, especialmente en lo que los especialistas llaman «variantes tardías»; esto es, aquellos casos excepcionales en los que los afectados son adolescentes e incluso adultos.
«Por desgracia en este mundo nada es gratis. El Estado tiene unos presupuestos limitados y no puede investigar las 7.000
enfermedades raras que existen», apunta Beatriz. Al otro costado de la investigación, el de la industria farmacéutica, invertir en Tay-Sachs también le resulta poco atractivo en términos comerciales. ¿La razón? La menciona sin morderse la lengua: «Sacar al mercado un medicamento súper caro que solo te van a comprar 13 personas no es rentable».
Economista especializada en áreas internacionales, Beatriz dejó su trabajo para dedicarse a cuidar de Isabel. Jamás perdió la costumbre de «mirar al exterior», y eso fue exactamente lo que hizo cuando los médicos le desvelaron la afección que aquejaba a su hija. Descubrió así que en Cambridge y Massachusetts existían sendos equipos de investigadores siguiendo la pista de Tay-Sachs y Sandhoff –su hermana gemela– a través de una posible terapia génica. Aún en fase experimental, esta terapia aspira a corregir el defecto genético en su origen: eliminaría los problemas de acumulación de toxinas, revertiría la falta enzimática de HEX-A y provocaría la reanudación de un desarrollo neurológico normal.
Beatriz decidió ponerse en contacto con Cambridge y fue precisamente una conversación con el líder de esta investigación, el profesor Timothy M. Cox, la que quedaría grabada en la mente de la almeriense. «Yo no creo en Dios, pero sí en los milagros. Y te prometo que voy a hacer lo imposible para que llegue un milagro algún día». Por aquel entonces, Beatriz ya era consciente de que difícilmente ese milagro llegaría a tiempo para Isabel. Pero eso no le impidió embarcarse en la aventura de fundar una asociación para combatir esta extraña dolencia. Un año después está volcada con ACTAYS (Acción y Cura para Tay-Sachs), que aspira a cubrir los «huecos» a los que el Estado no llega.
La esperanza, en la terapia génica
Beatriz Fernández, en la sede de ABC (Foto: Maya Balanya)

Unidades especializadas

En esta asociación «todos son voluntarios, incluida yo», constata. La ONG busca un voluntariado profesional donde «las posibilidades son infinitas»: una enfermera, un fotógrafo o alguien que sepa portugués y pueda traducir la web para que el paraguas de ACTAYS se extienda a Portugal y Brasil –dos países que no cuentan con una asociación especializada en Tay-Sachs pero sí con varios afectados entre su población–.
«En España tenemos un cuerpo médico excelente, pero existen más enfermedades raras que comunes y son tan poco prevalentes que es lógico que los médicos no las controlen todas», comenta la directora de la asociación. Tay-Sachs, sin ir más lejos, se da en uno de cada 360.000 nacidos. A este respecto, Beatriz quiere recordar la «buena suerte» que tienen quienes nacen en una ciudad grande como Madrid o Barcelona.
En la capital de España la unidad de Cuidados Paliativos Pediátricos del Niño Jesús realiza una «labor extraordinaria». Con el doctor Ricardo Martino a la cabeza, esta unidad funciona 24 horas los 365 días del año y ofrece incluso asistencia a domicilio. «Eso evita hospitalizaciones y otorga una gran seguridad: la de saber que, si descuelgas el teléfono, hay alguien que en 30 minutos está en tu casa», apunta Beatriz. Y es que «en un determinado momento, las complicaciones se multiplican y los intervalos libres de síntomas son cada vez más cortos», constata el doctor Martino. Quienes según la almeriense salen peor parados son aquellos afectados que residen en ciudades más pequeñas e incluso pueblos que «no disfrutan, ni de lejos, de las mismas atenciones».

El desafío actual

«Isabel ha tenido la mágica virtud de dejarme desprovista de miedos». Esta pequeña que en su breve existencia no pudo comentarle a su madre si deseaba estudiar en Harvard sí que dio a Beatriz importantes lecciones: «Me enseñó que todos tenemos nuestro lugar y que por insignificante que sea lo que tú puedes aportar al mundo, con que llegue a una persona ya merecerá la pena». El desafío actual, no solo de la directora de ACTAYS sino de todas las personas que hay detrás de estas siglas, pasa poraguardar pacientes ese «milagro» al que se refería el profesor Cox y volver la mirada al Estado para decir: «Oye, ¡que nosotros también importamos!»













------------------------------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito