09/10/2014 - 14:50
DECISÃO
Terceira Turma reconhece dano moral a bebê que não teve células-tronco colhidas na hora do parto
Por maioria de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o dano moral sofrido por um bebê em razão da não coleta de células-tronco de seu cordão umbilical.O caso aconteceu no Rio de Janeiro, em 2009. Os pais contrataram a Cryopraxis Criobiologia Ltda., empresa especializada em serviços de criopreservação, para que fosse feita a coleta das células-tronco do filho no momento do parto.
Apesar de previamente avisada da data da cesariana, a empresa deixou de enviar os técnicos responsáveis pela coleta do material, e o único momento possível para realização do procedimento foi perdido.
Dano hipotético
Foi ajuizada ação de indenização por danos morais em que constaram como autores o pai, a mãe e o próprio bebê.
A empresa admitiu que sua funcionária não conseguiu chegar a tempo ao local da coleta e disse que por isso devolveu o valor adiantado pelo casal. Sustentou que o simples descumprimento contratual não dá margem à reparação de danos morais.
O juízo de primeiro grau, no entanto, considerou que o fato superou os meros dissabores de um descumprimento de contrato e reconheceu o dano moral (R$ 15 mil para o casal), porém julgou improcedente o pedido feito em nome da criança. Para a juíza, o dano em relação a ela seria apenas hipotético, e só se poderia falar em dano concreto se viesse a precisar das células-tronco embrionárias no futuro.
Sem consciência
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) também limitou o cabimento de indenização por danos morais aos pais da criança, por entender que um bebê de poucas horas de vida não dispõe de consciência capaz de potencializar a ocorrência do dano.
A decisão levou em consideração que, como a criança nasceu saudável e a utilização do material do cordão umbilical seria apenas uma possibilidade futura, não deveria ser aplicada a teoria da perda de uma chance, por não ter sido evidenciada a probabilidade real de que ela viesse a necessitar de tratamento com base em células-tronco. Assim, em relação à criança, não haveria o que reparar.
O TJRJ, entretanto, elevou o valor da condenação, fixando-a em R$ 15 mil para cada um dos genitores.
Dignidade
O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, entendeu pela reforma da decisão. Segundo ele, a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de reconhecer ao nascituro o direito a dano moral, ainda que não tenha consciência do ato lesivo.
Segundo o ministro, os direitos de personalidade do nascituro devem ser tutelados sempre tendo em conta o princípio da dignidade da pessoa humana, o que derruba o fundamento adotado pelo tribunal fluminense.
“A criança foi a principal prejudicada pelo ato ilícito praticado pela empresa”, disse o relator ao reconhecer que foi frustrada a chance de ela ter suas células embrionárias colhidas e armazenadas para eventual tratamento de saúde, o que configurou o dano extrapatrimonial indenizável.
Perda da chance
O argumento de dano hipotético também foi afastado pelo relator. Para ele, ficou configurada na situação a responsabilidade civil pela perda de uma chance, o que dispensa a comprovação do dano final.
Sanseverino afirmou que, de fato, não há responsabilidade civil sem dano, mas “entre o dano certo e o hipotético existe uma nova categoria de prejuízos, que foi identificada pela doutrina e aceita pela jurisprudência a partir da teoria da perda de uma chance”.
“A chance é a possibilidade de um benefício futuro provável, consubstanciada em uma esperança para o sujeito, cuja privação caracteriza um dano pela frustração da probabilidade de alcançar esse benefício possível”, explicou o ministro ao discorrer sobre a evolução da teoria da perda de uma chance na doutrina jurídica.
Prejuízo certo
“Por isso, na perda de uma chance, há também prejuízo certo, e não apenas hipotético”, afirmou, esclarecendo que “não se exige a prova da certeza do dano, mas a prova da certeza da chance perdida, ou seja, a certeza da probabilidade”. Ele citou diversos precedentes que demonstram a aceitação da teoria na jurisprudência do STJ.
“É possível que o dano final nunca venha a se implementar, bastando que a pessoa recém-nascida seja plenamente saudável, nunca desenvolvendo qualquer doença tratável com a utilização de células-tronco retiradas do cordão umbilical. O certo, porém, é que perdeu definitivamente a chance de prevenir o tratamento dessas patologias, sendo essa chance perdida o objeto da indenização”, concluiu o relator.
A empresa foi condenada a pagar R$ 60 mil de indenização por dano moral à criança.
Apesar de previamente avisada da data da cesariana, a empresa deixou de enviar os técnicos responsáveis pela coleta do material, e o único momento possível para realização do procedimento foi perdido.
Dano hipotético
Foi ajuizada ação de indenização por danos morais em que constaram como autores o pai, a mãe e o próprio bebê.
A empresa admitiu que sua funcionária não conseguiu chegar a tempo ao local da coleta e disse que por isso devolveu o valor adiantado pelo casal. Sustentou que o simples descumprimento contratual não dá margem à reparação de danos morais.
O juízo de primeiro grau, no entanto, considerou que o fato superou os meros dissabores de um descumprimento de contrato e reconheceu o dano moral (R$ 15 mil para o casal), porém julgou improcedente o pedido feito em nome da criança. Para a juíza, o dano em relação a ela seria apenas hipotético, e só se poderia falar em dano concreto se viesse a precisar das células-tronco embrionárias no futuro.
Sem consciência
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) também limitou o cabimento de indenização por danos morais aos pais da criança, por entender que um bebê de poucas horas de vida não dispõe de consciência capaz de potencializar a ocorrência do dano.
A decisão levou em consideração que, como a criança nasceu saudável e a utilização do material do cordão umbilical seria apenas uma possibilidade futura, não deveria ser aplicada a teoria da perda de uma chance, por não ter sido evidenciada a probabilidade real de que ela viesse a necessitar de tratamento com base em células-tronco. Assim, em relação à criança, não haveria o que reparar.
O TJRJ, entretanto, elevou o valor da condenação, fixando-a em R$ 15 mil para cada um dos genitores.
Dignidade
O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, entendeu pela reforma da decisão. Segundo ele, a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de reconhecer ao nascituro o direito a dano moral, ainda que não tenha consciência do ato lesivo.
Segundo o ministro, os direitos de personalidade do nascituro devem ser tutelados sempre tendo em conta o princípio da dignidade da pessoa humana, o que derruba o fundamento adotado pelo tribunal fluminense.
“A criança foi a principal prejudicada pelo ato ilícito praticado pela empresa”, disse o relator ao reconhecer que foi frustrada a chance de ela ter suas células embrionárias colhidas e armazenadas para eventual tratamento de saúde, o que configurou o dano extrapatrimonial indenizável.
Perda da chance
O argumento de dano hipotético também foi afastado pelo relator. Para ele, ficou configurada na situação a responsabilidade civil pela perda de uma chance, o que dispensa a comprovação do dano final.
Sanseverino afirmou que, de fato, não há responsabilidade civil sem dano, mas “entre o dano certo e o hipotético existe uma nova categoria de prejuízos, que foi identificada pela doutrina e aceita pela jurisprudência a partir da teoria da perda de uma chance”.
“A chance é a possibilidade de um benefício futuro provável, consubstanciada em uma esperança para o sujeito, cuja privação caracteriza um dano pela frustração da probabilidade de alcançar esse benefício possível”, explicou o ministro ao discorrer sobre a evolução da teoria da perda de uma chance na doutrina jurídica.
Prejuízo certo
“Por isso, na perda de uma chance, há também prejuízo certo, e não apenas hipotético”, afirmou, esclarecendo que “não se exige a prova da certeza do dano, mas a prova da certeza da chance perdida, ou seja, a certeza da probabilidade”. Ele citou diversos precedentes que demonstram a aceitação da teoria na jurisprudência do STJ.
“É possível que o dano final nunca venha a se implementar, bastando que a pessoa recém-nascida seja plenamente saudável, nunca desenvolvendo qualquer doença tratável com a utilização de células-tronco retiradas do cordão umbilical. O certo, porém, é que perdeu definitivamente a chance de prevenir o tratamento dessas patologias, sendo essa chance perdida o objeto da indenização”, concluiu o relator.
A empresa foi condenada a pagar R$ 60 mil de indenização por dano moral à criança.
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CEBID - Centro de Estudos em Biodireito
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