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terça-feira, 2 de junho de 2015

Leelah Alcorn teve todosseus pedidos para iniciar sua transição negados pelos pais católicos; petiçãoonline tenta colocar o nome que escolheu em sua lápide

 

por Marcio Caparica(@marciocaparica
No último domingo, dia 28 de dezembro, a adolescente Leelah Alcorn morreu atropelada por um caminhão na cidade de Union Township, em Ohio, EUA. Leelah era uma garota transexual, lutando para conseguir iniciar sua transição para o sexo com que se identificava. Ela caminhou aproximadamente 5 km da casa onde morava com seus pais até a estrada I-71, onde se jogou na frente do veículo e morreu.
Pouco tempo depois de sua morte, uma carta de suicídio foi publicada automaticamente em seu blog. Nela, Leelah culpa diretamente seus pais por sua morte. Consciente desde os 14 anos de que era uma garota trans, Leelah teve seus pedidos para que sua transição tivesse início antes da puberdade negada pelos pais. Pior ainda, foi forçada por eles a frequentar terapeutas cristãos que só faziam aumentar sua sensação de inadequação, tentando convencê-la a aceitar seu sexo de nascimento.
A mãe de Leelah, Carla Wood Alcorn, publicou uma mensagem em seu perfil no Facebook no dia do suicídio em que continua a usar o nome de nascimento da filha: “Meu doce filho de 16 anos [sic], Joshua Ryan Alcorn foi para seu lar no céu esta manhã. Ele saiu para uma caminhada de manhã cedo e foi atingido por um caminhão. Obrigado pelas mensagens e bondade e preocupação que vocês mandaram para nós. Por favor continuem a nos manter em suas orações.” Carla, ontem, declarou ao canal CNN, “nós não apoiamos [a transição de sexo], religiosamente. Mas nós lhe dissemos que o amávamos incondicionalmente. Nós o amávamos, não importa o que acontecesse. As pessoas precisam saber que nós o amávamos. Ele era um garoto bom, um menino bom.”
A resposta para isso ela já tem, vindo de outro post que Leelah deixou programado com mensagens para os irmãos e os pais: “Mãe e pai: vão se fuder. Você não pode controlar as outras pessoas desse jeito. Isso é errado”.
Uma petição no site Change.org tenta fazer com que a lápide de Leelah exiba o nome que ela havia escolhido, e não Joshua, seu nome de nascimento. Até o momento, mais de 53 mil pessoas já deixaram sua assinatura na campanha. Outra petição exige que se crie uma lei nos EUA proibindo tratamentos de “cura gay”, como os ao que Leelah foi submetida.
Uma pesquisa do Instituto Williams de Los Angeles publicada em 2014 estimou que 40% das pessoas transgênero já tentou cometer suicídio em algum ponto da vida.
Leia a seguir a triste carta de suicídio de Leelah, traduzida de seu blog.
BILHETE DE SUICÍDIO
Se você está lendo isso, quer dizer que eu cometi suicídio e obviamente não consegui apagar esse post da minha fila de publicação.
Por favor não fique triste, é para o bem. A vida que eu teria vivido não valia a pena ser vivida… porque eu sou transgênero. Eu poderia entrar nos detalhes para explicar por que eu sinto isso, mas essa mensagem provavelmente já vai ser bem comprida sem isso. Para dizer de forma simples, eu sinto que sou uma garota aprisionada no corpo de um garoto, e eu sinto isso desde que tinha 4 anos. Eu nunca soube que havia um nome para essa sensação, nem que era possível para um garoto se tornar uma garota, então nunca contei isso para ninguém e continuei a simplesmente fazer coisas tradicionalmente “de moleque” para tentar me encaixar.
Quando eu tinha 14 anos, eu aprendi o que queria dizer transgênero e chorei de alegria. Depois de 10 anos de confusão, eu finalmente compreendi quem eu era. Eu imediatamente contei par aminha mãe, e ela reagiu de forma extremamente negativa, me dizendo que isso era uma fase, que eu nunca seria realmente uma garota, que Deus não comete erros, que eu estava errada. Se vocês estiverem lendo isso, pais, por favor não digam isso para seus filhos. Mesmo se você for cristão ou contra pessoas transgênero não diga isso jamais para alguém, especialmente seu filho. Isso não vai realizar nada além de fazê-lo odiar a si mesmo. Foi exatamente isso que aconteceu comigo.
Minha mãe começou a me levar para um terapeuta, mas só me levava para terapeutas cristãos (todos eles muito preconceituosos), então eu nunca tive a terapia que eu realmente precisava para me curar de minha depressão. Eu só tive mais cristãos  me dizendo que eu era egoísta e estava enganada e deveria buscar ajuda em Deus.
Quando eu fiz 16 anos eu percebi que meus pais nunca mudariam de ideia, e que eu teria que esperar até fazer 18 anos para começar qualquer tipo de tratamento de transição, o que partiu completamente meu coração. Quanto mais você espera, mais difícil é fazer a transição. Eu me sentia sem esperança, sentia que eu ia passar o resto da vida parecendo ser um homem fantasiado de mulher. No meu aniversário de 16 anos, quando eu não recebi a permissão de meus pais para começar a fazer transição, eu chorei até dormir.
Eu passei a ter uma atitude de “foda-se” com relação aos meus pais e me declarei gay na escola, achando que talvez se eu fizesse uma passagem gradual até me declarar trans o choque seria menor. Apesar da reação dos meus aigos ter sido positiva, meus pais ficaram putos. Eles resolveram que eu estava atacando sua imagem, e que eu era um constrangimento para eles. Eles queriam que eu fosse seu garotinho cristão perfeito, e obviamente isso não era o que eu queria.
Então eles me tiraram da escola pública, esconderam meu laptop e meu celular, e me proibiram de entrar em qualquer tipo de mídia social, me isolando completamente dos meus amigos. Provavelmente essa foi a fase da minha vida em que eu fiquei mais deprimida, e estou surpresa que eu não me matei. Eu fiquei completamente sozinha por 5 meses. Nada de amigos, nada de apoio, nada de amor. Apenas a frustração dos meus pais e a cruedade da solidão.
No final do ano escolar, meus pais finalmente mudaram de ideia e devolveram meu celular e permitiram que eu retornasse às mídias sociais. Eu fiquei feliz, finalmente eu tinha meus amigos de volta. Eles ficaram extremamente felizes de me ver e conversar comigo, mas só no começo. Depois de um tempo eles perceberam que estavam cagando e andando para mim, e eu me senti ainda mais sozinha que antes. Os únicos amigos que eu pensava que tinha só gostavam de mim porque me encontravam cinco vezes por semana.
Depois de um verão quase sem amigos além do peso de ter que pensar sobre a faculdade, economizar dinheiro para sair de casa, manter minhas notas altas, ir para a igreja toda semana e me sentir uma merda porque todos lá são contra tudo pelo que eu vivo, eu decidi que já deu. Eu nunca vou conseguir fazer uma transição bem-sucedida, mesmo quando eu sair da casa dos meus pais. Eu nunca serei feliz com a minha aparência ou a maneira como eu vou soar. Eu nunca vou ter amigos o suficiente para ficar satisfeita. Eu nunca vou ter amor o suficiente para ficar satisfeita. Eu nunca vou encontrar um homem que me ame. Eu nunca vou ser feliz. Ou eu vivo o resto da minha vida como um homem solitário que gostaria de ser uma mulher, ou eu vivo minha vida como uma mulher ainda mais solitária que odeia a si mesma.  Não há como ganhar. Não há saída. Eu já estou triste o bastante, eu não preciso que minha vida fique ainda pior. As pessoas dizem que “a vida melhora” mas isso não é verdade no meu caso. A vida piora. A cada dia ela piora.
Essencialmente, é isso, essa é a razão porque eu quero me matar. Desculpe se essa não for uma razão boa o suficiente para você, é boa o suficiente para mim. Quanto ao meu testamento, eu quero que 100% das coisas que eu possuo legalmente sejam vendidas e que o dinheiro (mais o dinheiro que eu tenho no banco) seja doado para movimentos e grupos de apoio aos direitos civis trans, caguei para qual. A única maneira de eu descansar em paz é se um dia pessoas transgênero não forem tratadas como eu fui, sejam tratadas como humanos, com sentimentos válidos e direitos humanos. Gênero precisa ser ensinado nas escolas, quanto mais cedo, melhor. Minha morte precisa ter algum significado. Minha morte precisa ser contabilizada nas estatísticas de pessoas transgênero que cometem suicídio nesse ano. Eu quero que alguém veja essa estatística e pense “isso é uma merda” e dê um jeito nisso. Dê um jeito na sociedade. Por favor.
Adeus
(Leelah) Josh Alcorn

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