Acesse o nosso site: www.cebid.com.br

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Affaire Lambert et autres c. France: il n'y aurait pas violation del l'article 2 de la Convetion européene des droits de l'homme en cas de mise en aeuvre de la décision du Conseil d'État du 24 juin 2014











Comentário realizado por Diogo Luna Moreira:


Reflexão sobre a decisão do Tribunal Europeu de Direitos Humanos no caso Vincent Lambert



Uma vez mais o tema eutanásia volta a provocar rumores na sociedade francesa. Desta vez o protagonista é o enfermeiro francês Vincent Lambert, de 38 anos, que se encontra em estado vegetativo desde 2008, em decorrência de acidente de trânsito que lhe causou séria lesão cerebral.

Diante do estado clínico do paciente, a esposa de Vincent, Rachel Lambert, solicitou ao Conselho de Estado francês autorização para a suspensão do tratamento que mantinha a sobrevida de Vincent, o que foi deferido em meados de 2014. Entretanto, os pais de Vincent, indignados com a decisão, recorreram ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos impugnando a decisão do Conselho de Estado, uma vez que, segundo os recorrentes, a mesma contrariava o disposto no art. 2 da Convenção Europeia de Direitos Humanos que trata do direito à vida:

O direito de qualquer pessoa à vida é protegido pela lei. Ninguém poderá ser intencionalmente privado da vida, salvo em execução de uma sentença capital pronunciada por um tribunal, no caso de o crime ser punido com esta pena pela lei.

No dia 05 de junho de 2015, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu manter a decisão do Conselho de Estado francês confirmando a validade da legislação francesa que permite a interrupção ou não submissão à alimentação e à hidratação artificiais.

Para melhor entender o caso, necessário tecer algumas considerações sobre alguns dispositivos do Code de la Santé Publique que foi alvo de ataque no caso Vincent Lambert. (Para saber mais sugiro a leitura de: SÁ, Maria de Fátima de; MOUREIRA, Diogo Luna. Autonomia para morrer, 2ª Ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2015).

O Code de la Santé Publique Código de Saúde Pública francês, alterado pela Lei sobre os Direitos dos Doentes e Moribundos – Lei Leonetti, datada de 22 de abril de 2005, destaca o direito dos pacientes se autodeterminarem diante de situações médicas que digam respeito à sua saúde, inclusive no que tange aos direitos no final de sua vida. Segundo consta do art. L.1110-2, o doente tem direito ao respeito à sua dignidade: “la personne malade a droit au respect de sa dignité”.

Assegura a lei francesa que todo paciente tem o direito de ser informado sobre sua saúde, inclusive no que tange a medidas protetivas propostas, sua utilidade, seu grau de urgência, suas consequências, riscos previsíveis ou graves que têm sobre as alternativas e consequências prováveis em caso de recusa. Diante de tais informações, a referida lei assegura ao indivíduo a liberdade para tomar decisões sobre sua saúde. Assim, deve o médico respeitar a vontade da pessoa depois de esta ser informada das consequências de suas escolhas.

É possível que a vontade do paciente seja influenciada pelo médico ou outro membro da profissão médica, sempre que a recusa ou a decisão pela descontinuidade de qualquer tratamento implicar em risco de morte. Ainda assim, ratificada a decisão pelo paciente, deve o médico respeitá-la, interrompendo qualquer tratamento. Em sua redação originária, previa o artigo L.1111-4 da Lei dos Doentes, de 04 de março de 2002 que “Toute personne prend, avec le professionnel de santé et compte tenu des informations et des préconisations qu’il lui fournit, les décisions concernant sa santé. Le médecin doit respecter la volonté de la personne après l’avoir informée des conséquences de son choix. Si la volonté de la personne de refuser ou d’interrompre un traitement met sa vie en danger, le médecin doit tout mettre en œuvre pour la convaincre d’accepter les soins indispensables[1]”.

Com a nova redação promovida pela Lei de 22 de abril de 2005, a parte final do mencionado dispositivo legal foi alterado passando a constar: “Si la volonté de la personne de refuser ou d’interrompre tout traitement met sa vie en danger, le médecin doit tout mettre en œuvre pour la convaincre d’accepter les soins indispensables[2]”. A substituição de “um tratamento” para “todo tratamento” corresponde, segundo consta do Relatório da Assembleia Nacional Francesa, a possibilidade de interrupção não apenas de um tratamento farmacológico, mas inclui a possibilidade de interrupção ou não submissão à alimentação e à hidratação artificiais.

Foi com base nesta permissibilidade legal que o Conselho de Estado francês autorizou a suspensão da alimentação e hidratação artificiais que mantinham a sobrevida de Vincent Lambert.

Além disso, importante destacar que a Lei Leonetti prevê a razoabilidade na ação do médico, com o escopo de evitar qualquer “obstination déraisonnable”, de modo que deverá o médico pautar a sua conduta com o escopo de evitar “l’erreur par défaut”, isto é, a inobservância das recomendações procedimentais adequadas ao caso, bem como “l’erreur par excès”, compreendido como a submissão do paciente a tratamentos degradantes, inúteis, desproporcionais ou sem efeito algum de melhora do paciente, salvo para mantença artificial da sua vida. Sob este contexto, a Lei Leonetti prevê a possibilidade de o médico suspender ou não realizar tratamentos desproporcionais e inúteis, evitando-se, assim, o que foi denominado de “obstination déraisonnable”.

Note-se que, não obstante, a legislação francesa possibilite a interrupção ou a não submissão à alimentação e hidratação artificiais (artigo L.1111-4), a eutanásia é prática proibida.

Diante do caso Vincent Lambert e de vários outros semelhantes, como da italiana Eluana Englaro e da norte-americana Terri Schiavo, o questionamento é sempre o mesmo: seria adequado deixar alguém morrer de fome, mas não poderia haver uma injeção letal a conduzi-la à consequência irremediável da não alimentação ou hidratação?

Diogo Luna Moureira





[1]    “Toda pessoa toma, com o profissional da saúde e de posse do cômputo das informações e das declarações por ele fornecidas, as decisões concernentes à sua saúde. O médico deve respeitar a vontade da pessoa depois de  tê-la informado das consequências de sua escolha. Se a vontade da pessoa de recusar ou de interromper um tratamento coloca sua vida em perigo, o médico deve envidar todos os esforços para convencê-la a aceitar os procedimentos indispensáveis.” (Tradução livre)
[2]    “Se a vontade da pessoa de recusar ou de interromper todo tratamento coloca sua vida em perigo, o médico deve envidar todos os esforços para convencê-la a aceitar os procedimentos indispensáveis.” (Tradução livre)

Nenhum comentário:

Postar um comentário