25/09/2012 - 06h40
Rio quer devolver para casa pacientes psiquiátricos internados há décadas
DENISE MENCHEN
DO RIO
Diante da perspectiva do retorno do filho para casa, os pais de Elias Antônio Santana Vilhena reagiram com medo.
Com retardo mental grave e sem nunca ter aprendido a falar, Elias foi internado em uma clínica psiquiátrica aos oito anos, após episódios de agressividade e fugas frequentes. Quando deixou o local, em julho, era um homem de 37.
A saída fez parte do processo de desativação da clínica neuropsiquiátrica Amendoeiras, de Jacarepaguá, na zona oeste do Rio. Conveniada ao SUS, a instituição teve que ser fechada por ordem da Justiça. Os últimos quatro dos 136 internos deixaram o local no último dia 6.
A liminar foi concedida a pedido do Ministério Público Estadual, que em inspeção na clínica encontrou pacientes nus que se arrastavam sobre as próprias fezes. A nutrição também era inadequada e o atendimento, precário.
Manicômio do Rio
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O superintendente de Institutos Municipais de Saúde Mental da Secretaria Municipal de Saúde, Mario Barreira, diz que a Amendoeiras já foi referência para a internação de crianças com problemas mentais e neurológicos, mas se deteriorou ao longo dos anos --segundo ele, os proprietários alegavam que os repasses do SUS eram muito baixos. A reportagem não conseguiu contato com eles.
Barreira reconhece que a clínica deveria ter sido fechada antes e diz que há anos o município não mandava novos pacientes para lá. Desde 2001, uma lei federal veda a internação de pessoas com transtornos mentais em instituições com características asilares e sem serviços adequados de atendimento médico, assistência psicológica e reinserção social.
Apesar disso, ainda existem 27 hospitais psiquiátricos no Estado do Rio, segundo a Secretaria de Estado de Saúde.
No caso da clínica Amendoeiras, a maior dificuldade era encontrar um destino digno para os pacientes. O objetivo principal era, sempre que possível, devolver o interno ao convívio social.
"Se a pessoa está estabilizada, não há porque mantê-la em uma instituição", diz Mônica Almeida, superintendente de saúde mental da Secretaria Estadual de Saúde, que ajudou na realocação dos pacientes de fora da capital. "A internação deve ser o último recurso", defende.
Em alguns casos, porém, a gravidade do quadro não permitia a alta. Assim, 57 internos com alto comprometimento neurológico foram encaminhados para clínicas especializadas em cuidados prolongados.
Já para os pacientes psiquiátricos restaram três opções: o retorno para casa; a mudança para uma residência terapêutica, uma casa com até dez internos onde são acompanhados por cuidadores; e a transferência para outra instituição de saúde mental.
Teve então início um trabalho de pesquisa em documentos de internação, prontuários e registros de visita, a fim de localizar alguma pista sobre a família dos pacientes, muitos já há décadas sem contato familiar.
Apesar do esforço, a maioria acabou indo para outras instituições, onde será dada continuidade ao trabalho de localização de parentes e de preparação dos pacientes para uma vida mais autônoma.
Seis deles, porém, conseguiram sair da Amendoeiras direto para o convívio familiar.
No caso de Elias, que durante 29 anos só viu os pais em encontros esporádicos, o medo da família de recebê-lo de volta foi vencido com o trabalho de funcionários do CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) Simão Bacamarte, de Santa Cruz, na zona oeste. Avisados de que parentes dele moravam na região, a equipe foi atrás deles.
A primeira reação não foi boa.
"Eles me disseram que eu ia ter direito a um dinheiro para ajudar, mas eu não queria receber nem um tostão, eu queria que ele ficasse lá", conta o eletricista aposentado Manoel Carlos Cardoso de Vilhena, 70, pai de Elias.
Aos poucos, depois de ouvir que o filho estava sob tratamento e não representava perigo, os pais concordaram em encontrá-lo no CAPS. Pouco depois, o levavam para passar um fim de semana em família. Depois disso, não o deixaram mais.
"Eu acordei para minha responsabilidade de pai", diz Vilhena, que, durante o dia, deixa o filho no CAPS, onde participa de atividades ocupacionais e é avaliado regularmente por um psiquiatra. Medicado, Elias não foge mais de casa e nem está agressivo.
"Hoje ele me beija toda hora", conta a mãe, Adélia Santana de Vilhena, 64. "Vem com tanta força que às vezes tenho até que fazer cosquinha debaixo do braço para me soltar."
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CEBID - Centro de Estudos em Biodireito
Esta é uma situação bastante complicada. De um lado o Estado não consegue suportar financeiramente as casas de tratamento psiquiátrico. De outro temos pessoas que necessitam desse tratamento.
ResponderExcluirNeste caso, há que se ponderar até que ponto o Estado pode simplesmente devolver os tratados às suas famílias. É certo que muitas vezes estas famílias não fazem questão de tentar resolver o problema dentro de casa, para evitar o tratamento em lugar especializado.
Na minha opinião, o Estado deveria analisar com muito cuidado cada caso, para preservar os tratados e suas famílias.
Afinal, se uma casa de tratamento está caindo aos pedaços, a melhor solução seria reformá-la ou construir outras.