06.01.2015 | 14h24
Por células-tronco, pais congelam dentes de leite
dos filhos
"O que eu pago por ano é o preço de dois pares de sapato"
DA FOLHA DE S. PAULO
Seguindo a onda do cordão umbilical, pais têm pago pelo armazenamento da polpa de dentes
de leite dos seus filhos, que pode dar origem a células-tronco.
Embora os entusiastas digam que esse material poderá ser útil no futuro no tratamento de
doenças como alzheimer e diabetes, ainda não existe comprovação que essas células tenham
tal potencial.
A bancária Cristina Bittencourt, cujo pai morreu há nove anos por uma disfunção da medula
óssea, aos 66 anos, diz que o congelamento dos dentes dos filhos Felipe, 10, e Catarina, 7,
foi uma "segurança a mais" para o futuro. "O que eu pago por ano é o preço de dois pares de
sapato."
Em média, as empresas que já oferecem o serviço em São Paulo cobram R$ 2.000 iniciais mais
R$ 400 por ano pelos serviços de coleta, multiplicação das células e criopreservação
(congelamento em condições especiais).
José Ricardo Ferreira, proprietário da R-Crio, diz que o negócio ainda conta com poucos clientes.
Dentista de formação, ele espera ter retorno do investimento em cinco anos. Ferreira diz que
mesmo o dente do siso, para quem já está um pouco mais velho, pode ser utilizado.
Outro entusiasta é Nelson Lizier, biotecnólogo que concluiu o doutorado com a produção em
larga escala de células-tronco da polpa dentária. Ele é diretor-científico do Centro de Criogenia
Brasil, que também oferece o serviço.
Ele afirma que já existem duas pesquisas em andamento para a aplicação das células: uma em
lesão de córnea e outra para enxertos ósseos.
Para outras doenças, no entanto, os tratamentos ainda estão sendo feitos em animais, com
formação de células produtoras de insulina no pâncreas (para diabetes) e de novos neurônios
a partir das células-tronco (para doenças neurodegenerativas).
"A gente não sabe o dia de amanhã, creio que muitos benefícios vão surgir", afirma o químico
Kléber Vasconcellos, que não tem nenhuma doença na família mas decidiu armazenar a polpa
do dente de leite do filho Vitor, 10.
Ressalvas
Procurada pela Folha, a Anvisa afirmou que as empresas podem oferecer o serviço de
criopreservação, mas sem prometer tratamento para nenhuma doença, fato que elas devem
deixar claro no contrato firmado com os clientes.
A pesquisadora Monica Duailibi, da Unifesp, conta que muitos estudos clínicos ainda estão em
fase inicial, ou seja, a sua própria segurança ainda está em xeque. Por isso, diz, os
consumidores têm que ter cuidado.
A pesquisadora do Instituto Butantan e orientadora de Lizier na pós-graduação, Irina Kerkis,
afirma que é importante que as pessoas estejam cientes de que podem pagar durante anos por
um serviço de que nunca vão necessitar.
Ela cita ainda o risco de perda de viabilidade, que ocorre com o tempo ou mesmo por negligência
de um funcionário que deixou a temperatura do nitrogênio líquido –onde são guardadas as
células– subir.
Irina acredita, porém, que como a origem embrionária da polpa do dente de leite é compartilhada
com a dos neurônios, é provável que se torne possível tratar doenças neurodegenerativas assim.
Ela defende que o governo invista na área, inclusive com a criação de bancos públicos de
células-tronco.
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CEBID - Centro de Estudos em Biodireito
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