Duplicaram os estrangeiros que foram à Suíça para morrer, três eram portugueses
Entre 2008 e 2012 mais de 600 estrangeiros foram à Suíça para pôr fim à vida. Mulheres em maioria. As doenças neurológicas são as mais presentes.
Em Portugal, o caso mais falado
foi o de uma mulher de 67 anos, com um cancro em fase terminal. Foi a primeira
portuguesa que recorreu a uma organização onde é possível pagar para ter acesso
a um suicídio assistido, na Suíça. Um artigo publicado nesta semana no Journal
of Medical Ethics revela que entre 2008 e 2012, 611 pessoas, de 31 países do
mundo, entre os quais três portugueses, aterraram em Zurique com o objectivo de
pôr termo à vida. De 2009 para 2012 o número duplicou. A maioria são mulheres.
Quatro investigadores, entre os
quais dois do Instituto de Medicina Legal da Universidade de Zurique – que
dizem que são chamados “quase todos os dias para examinar casos de turismo de suicídio”
–, escreveram um artigo chamado, precisamente, Turismo do suicídio: estudo
piloto sobre o fenómeno suíço.
O que o artigo contém de novo é,
essencialmente, a análise feita ao perfil dos doentes que recorreram às quatro
organizações que na Suíça disponibilizam morte assistida a estrangeiros (já
tinha sido noticiado que havia três portugueses que tinham recorrido ao
suicídio assistido naquele país).
As doenças neurológicas, como a
de Parkinson, estão presentes em 47,4% dos casos (290); o cancro foi a segunda
patologia registada (37,2%). Seguem-se as doenças reumáticas e
cardiovasculares. Há ainda 21 casos de doenças mentais e oito de HIV.
Os autores notam que há mais
gente a procurar a morte assistida sofrendo de doenças que não matam, ou não
estando em fase terminal — sublinham, contudo, que é preciso aprofundar mais a
investigação sobre os motivos das pessoas. Muitas (cerca de um terço) sofriam
de mais do que uma patologia.
Os alemães (268) são os
principais “clientes” deste serviço. Depois os cidadãos do Reino Unido (126),
da França (66), da Itália (44), dos Estados Unidos (21)... A mediana de idades
é 69 anos – mas o doente mais novo tinha 23. Quase seis em cada dez (58,3%) são
mulheres.
“Para este estudo não analisámos
as características sócio-demográficas de forma discriminada, por país ou
região”, explica ao PÚBLICO Saskia Gauthier, do Instituto de Medicina Legal
suíço. Ou seja, não há pormenores relativos aos doentes portugueses. Contudo,
há um projecto em curso que analisará em detalhe 30 anos de suicídio assistido
na Suíça, continua. E esse poderá vir a revelar mais sobre os estrangeiros que
viajam para se suicidar – na sua maioria numa clínica chamada Dignitas, nascida
em 1998, que diz que já ajudou 1700 pessoas a morrer, nacionais e estrangeiras.
O método mais comum passa pela ingestão de uma dose de pentobarbital de sódio
que mata em minutos. O processo de análise e preparação dos candidatos pode
contudo levar meses.
Em Portugal, como na generalidade
dos países, nem a eutanásia (que designa uma situação em que alguém administra
a um doente, a seu pedido, uma dose letal de fármacos) nem o suicídio assistido
(é o doente, ainda que sob vigilância de um técnico, que ingere a droga) são
legais.
Na Suíça a prática é antiga. E o
facto de muitos estrangeiros quererem deslocar-se até lá tem levado, nos países
de origem do mesmos, a grandes debates. E inclusivamente a mudanças. Foi o que
se passou em Inglaterra. Debbie Purdy, que sofre de uma forma muito
incapacitante de esclerose múltipla, pediu aos tribunais ingleses que
clarificassem se o companheiro dela poderia ser acusado se a levasse até à
Suíça para ela se suicidar.
Disseram-lhe que sim. E seguiu-se
uma batalha legal, muito mediatizada. Em 2010, o Crown Prosecution Service
emitiu novas orientações que estabelecem que nem sempre é do interesse público
julgar alguém que, “motivado pela compaixão”, tenha uma “participação menor” no
suicídio. Desde então, notam os autores do artigo desta semana, muitos mais
doentes britânicos passaram a ir à Suíça para ter uma morte assistida.
-----------------------------------------------------------------
CEBID - Centro de Estudos em Biodireito
Nenhum comentário:
Postar um comentário